quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Diálogo


- É muito longo o instante esvaziado de você.
- Respire fundo e prenda o máximo d'eu que puder.
- Não cabe tudo.
- O que fica não é sobra. É a sobremesa.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Terror de te amar


Terror de te amar num sítio tao frágil como o mundo

Mal de te amar neste lugar de imperfeiçao
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa.

(Sophia de Mello Breyner Andresen)

Vertigem


sábado, 20 de setembro de 2008

Amanhecer em branco-e-preto



"Funcionar é preciso; viver não é preciso. Por que tudo tão rápido? Para chegar aonde, para gozar sem parar? Mas gozar como? Nossa vida é uma ejaculação precoce. Estamos todos gozando sem fruição, um gozo sem prazer, quantitativo. Antes, tínhamos passado e futuro; agora tudo é um "enorme presente", na expressão de Norman Mailer. E esse "enorme presente" nos faz boiar num tempo parado, mas incessante, num futuro que "não pára de não chegar". Antes, tínhamos os velhos filmes em branco-e-preto, fora de foco, as fotos amareladas, que nos davam a sensação que o passado era precário e o futuro seria luminoso. Nada. Nunca estaremos no futuro. E, sem o sentido da passagem dos dias, de começo e fim, ficamos também sem presente. Estamos cada vez mais em trânsito, como carros, somos celulares, somos circuitos sem pausa, e cada vez mais nossa identidade vai sendo programada. O tempo é uma invenção da produção.

Não há tempo para os bichos. Se quisermos manhã, dia e noite, temos de ir morar no mato."

(AMOR É PROSA SEXO É POESIA, de Arnaldo Jabor)

Sobre ratos, roupas e reis



As certezas roem as horas que se rasgam em palavras. A verdade da tua mentira está na voz deslizante que despovoa as reticências. O rato roeu as honras do rei do riso. O resto é relato rouco em rápido religar de rendas.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Tem certeza que você sempre diz a verdade?


"O que é, pois, a verdade? Um exército móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma soma de relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o são, metáforas que se tornaram desgastadas e sem força sensível, moedas que perderam seu troquel e agora são levadas em conta apenas como metal, e não mais como moedas."

(Friedrich Nietzche)


segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Carnal


Não há mais epiderme em um olhar. Só nos resta a enxaqueca do afago. O sorriso míope, a carícia hepática. Os músculos rasgados em cutícula, gotícula, partícula. Tudo acabado em um vômito cardíaco. Não há mais texto para o pretexto.

ménage-à-trois


te ver
ter
ver
verter
converter
conter
comer e ter
cometer
meter
me ter
ver e ter
ver te
ter e ver
ter te
teve
tevê

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Sobre teleféricos, escorregadores e lunetas


E você, não sente falta de inventar o depois? Você fica aí, a esperar a cor do amanhã, tagarelando solidão e saudade, com os olhos tão engordurados de estrelas, senhas e teleféricos, que se esquece da própria escuridão. Daquela, entalhada na gruta que te esfaqueia as hipóteses. Sim, eu falo daquele buraco que estica suas profundezas até o impossível de se ver. Falo do vazio que lhe martela o esqueleto, pouco a pouco, com batidinhas camufladas que transformam as palavras em certezas escorregadias.

Por isso decidi costurar as janelas. Quando abotoamos o céu, não precisamos de lunetas. É como se o olhar estivesse empalhado: não há cores, apenas o lento desbotar do espaço.


sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Sobre olhares e foices


Dois olhares separados por uma janela, um portão, uma rua, um pára-brisa. Não tiveram tempo de esfaquear o espaço. O instante-foice.

Um, ao lado de fora, perdido no ele-ela-foi, eu-ele-sou. O outro, em sua existência-silhueta na janela, um inaudível eu-ele-fui do não mais. O instante foi-se.

No entre-sombras, a olhar ares, há olhares. A campainha toca. Ele-múltiplo, que se devolve e se despossui. Não há ares, há olhos e mares. O oi-adeus estomacal entre porta e sofá. O instante fosse.

Olhos a espera, por detrás do pára-brisa. Espera-foice se o instante fosse o que foi-se.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Vai um abraço?











Quero te conter no meu abraço epidérmico, até despossuí-lo de olhares, ares, mares. Até que o todo de você se derreta em líquido eu. E meu rosto se desfaça em epilético sorriso. Esquelético fundir em epitético fulgir.